Jean Paul Nacivet
Conheci a escritora italiana Natalia Ginzburg ( 1916-1991) ,
através do livro " As Pequenas Virtudes " que ganhei neste
mês de fevereiro .
Não poderia ter sido presente melhor .
É a reunião de onze ensaios publicados em jornais e
revistas entre 1944 a 1962.
O livro é dividido em duas partes sendo que na primeira
há a descrição de seus deslocamentos e suas impressões .
Na segunda parte , ela nos apresenta textos com um apelo
mais pessoal , falando de sua relação com a escrita
e com as pessoas .
Textos curtos que nos colocam entre a crueza do cotidiano
e acontecimentos que redefinem a relação do ser humano
com a vida .
Ser exilada , passar por privações , sobreviver
a uma guerra .
Escritos após a morte de seu primeiro marido ,
Leone Ginzburg , os ensaios não recaem em tom sentimental
mas há neles a lucidez de quem sofreu ,
tem seus filhos para cuidar e precisa seguir adiante .
Partilho com vocês algumas linhas do ensaio que dá
título ao livro .
" No que diz respeito à educação dos filhos ,
penso que se deva ensinar a eles não as pequenas virtudes ,
mas as grandes .
Não a poupança , mas a generosidade e a indiferença ao
dinheiro ; não a prudência , mas a coragem e o desdém
pelo perigo ; não a astúcia , mas a franqueza e o amor
à verdade ; não a diplomacia , mas o amor ao próximo
e a abnegação ; não o desejo de sucesso , mas o desejo de
ser e de saber .
No entanto fazemos frequentemente o contrário :
apressamo-nos a ensinar o respeito
pelas pequenas virtudes ,
fundando sobre elas todo o nosso sistema educativo .
Deste modo , escolhemos a via mais cômoda : porque as
pequenas virtudes não apresentam nenhum perigo
material , ao contrário , nos mantêm ao abrigo dos
golpes de sorte . Descuidamos de ensinar as grandes
virtudes , apesar de amá-las , e gostaríamos que nossos
filhos as assimilassem : mas nutrimos a confiança de
que elas emergirão espontaneamente de seu espírito ,
num dia futuro , considerando-as de natureza instintiva ,
ao passo que as outras , as pequenas , nos parecem fruto
de reflexão e cálculo , e por isto pensamos que
devem ser absolutamente ensinadas .
Na verdade a diferença é só aparente .
As pequenas virtudes provêm igualmente do fundo
do nosso instinto , de um instinto de defesa : mas nelas
a razão fala , sentencia , disserta , como um brilhante
advogado da integridade pessoal .
As grandes virtudes jorram de um instinto em que
a razão não fala , um instinto ao qual me seria difícil
dar um nome . E o melhor de nós está neste instinto
mudo , e não em nosso instinto de defesa , que argumenta ,
sentencia e disserta com a voz da razão ."
in , As pequenas virtudes "
Som na caixa ...
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