terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Na água



" eu piso no que sobrou do choro .

eu piso no que sobrou da chuva.

enfio meus pés no suor que escorreu

do meu corpo . na água que nasceu pura.

na sujeira saída do banho .


eu piso no caldo , na mistura .

é nela que me fortaleço.

na água que entra pelos vãos dos meus dedos .

na que sobe até a cintura .

é nela que me inundo . com ela que eu cresço.

como raiz que se alimenta do que está no vaso.

absorvo de volta o que transbordei .

lágrimas de amores errados . saliva caída de beijos.

suor escorrido pelas costas . medos que transpirei .

eu piso no que já foi tempestade e agora é poça.

na água que já foi benta e agora é profana .

eu piso no que foi batismo e agora é pecado .

no transparente que agora é opaco .

é na mistura que me fortaleço .

eu piso . sugo .engulo .

tomo de volta o que já foi meu .

o que veio com a chuva .

o que a corrente não levou .

o que ainda não secou .

eu me encho . me derramo .

eu piso na água pra poder mudar

com a lua .

balançar como onda .acompanhar a maré .

eu piso na água pra poder voltar para

o lugar que fui expulso . pro úmido .

silêncio escuro do útero .

eu piso na água pra renascer ."



Eduardo Baszczyn

jornalista e escritor


autor do romance " Desamores "

escreve o blog " Coisas da Gaveta"

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