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quinta-feira, 17 de setembro de 2020

O ALFABETO NO PARQUE



David  Lee Thompson 


" Eu   sei escrever . 
Escrevo cartas , bilhetes , lista de compras ,
composição escolar narrando o belo passeio 
à fazenda de vovó que nunca  existiu 
porque ela era pobre como Jó . 
Mas escrevo também coisas inexplicáveis: 
quero ser feliz , isto é amarelo .
E não consigo , isto é dor .
Vai-  te  de mim , tristeza , sino gago ,
pessoas dizendo entre soluços :  
" não aguento mais ".
Moro num lugar chamado globo terrestre
onde se chora mais 
que o volume das águas denominadas mar ,
para onde levam os rios outro tanto de lágrimas .
Aqui se passa fome . Aqui se odeia .
Aqui se é feliz , no meio de invenções  miraculosas .
Imagine que uma dita roda gigante 
propicia passeios  e vertigens 
entre luzes , música , namorados em êxtase .
Como é bom ! De um lado os rapazes .
De outra as moças , eu louca para casar
e dormir  com meu marido no quartinho 
de uma casa antiga com soalho de tábua .
Não há como não pensar na morte ,
entre tantas delícias , querer ser eterno .
Sou alegre e sou triste , meio a meio .
Levas tudo a peito , diz minha mãe ,
dá uma volta , distrai-te , vai ao cinema .
A mãe  não sabe , cinema é como dizia o avô :
" cinema é gente passando .
Viu uma vez , viu todas ."
Com perdão da palavra , quero cair na vida .
Quero ficar no parque , 
a voz do cantor açucarando  a tarde ...
Assim escrevo : tarde . Não a palavra .
A coisa . "

Adélia Prado 

Som  na  caixa ...



 



 

sábado, 18 de maio de 2019

VEROSSÍMIL

Victor Nizovtsev

" Antigamente ,  em maio , 
 eu virava anjo .
A mãe me punha vestido ,
as  asas , me encalcava  a coroa
 na cabeça  e encomendava :
" Canta alto  , espevita as palavras bem ."
Eu levantava voo rua acima ."

Adélia Prado 

A página de hoje  é para o Felipe ,
meu filho , que nasceu num 18 de maio
me deixando a sensação que eu  era 
  um verdadeiro anjo a voar de felicidade .
Saúde , sucesso e amor com as 
bençãos de Deus .

Som na caixa ...

Uma música que ele gosta bastante .  




  

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

O NATAL VEM CHEGANDO ...

Imagem  da net 

" À  meia noite no pasto 
guardando nossas vaquinhas 
um grande clarão no céu
guiou-nos a esta lapinha .
Achamos este Menino 
entre Maria e José ,
um menino tão formoso ,
precisa dizer quem é ?
Seu nome santo é Jesus ,
Filho de Deus muito amado,
 em sua caminha de cocho 
dormia bem sossegado .
Adoramos o Menino  
nascido em tanta pobreza 
e lhe oferecemos presentes 
de nossa pobre riqueza :
a nossa manta de pele ,
o nosso gorro de lã ,
nossa faquinha amolada ,
o nosso chá de hortelã .
Os anjos cantavam hinos 
cheios de vivas e améns .
A alegria era tão grande 
e nós cantamos também:
Que noite bonita é esta 
em que a vida fica mansa ,
em que tudo vira festa 
e o mundo inteiro descansa ?
Esta é uma noite encantada  ,
nunca assim aconteceu ,
os galos todos saudando :
O Menino Jesus nasceu ! "

Adélia Prado , no poema 
Cantiga dos Pastores 

Desejo a  vocês , amigos queridos , 
um Natal de bençãos , alegria e paz .
Beijos

Som na caixa ...



domingo, 24 de janeiro de 2016

VERSOS DO DIA ...

imagem da net 

"  ...  a vida é tão bonita ,
basta um beijo e a delicada engrenagem  movimenta-se ,
uma necessidade cósmica nos protege ."

Adélia Prado : O pelicano 

Som  na  caixa ...








sábado, 27 de setembro de 2014

O SEMPRE AMOR

Fernanda  e Guilherme 

" Amor é a coisa  mais  alegre 
 amor é a coisa  mais triste 
amor  é  coisa  que  mais quero.
Por  causa  dele falo palavras  como  lanças .
Amor  é a coisa  mais alegre 
 amor é a coisa mais triste 
amor é coisa que mais quero .
Por  causa dele podem entalhar-me ,
sou de pedra-sabão .
Alegre  ou  triste ,
amor é coisa  que  mais quero ."

Adélia Prado 
in , " Reunião de poesia "

Hoje é aniversário da Fernanda , minha filha ,
e a página é para ela .
No som da caixa , está uma música tocada 
em seu casamento com Guilherme , há cinco anos .

Parabéns  , Fê !
Saúde e muito amor, sempre ,
com as bençãos de Deus .

Beijos de todos 

Som  na  caixa ...

terça-feira, 22 de julho de 2014

TRÊS NOMES

Alex  Alemany 


"  Assim  me  falou  o homem 
virtuoso  em sua  vida :
Deus  não é uma luz , 
desatenta mulher ,
Deus  é  pessoa .
Isto  pode  ser  um  poema 
sob três  nomes  viáveis : 
Aconselhamento espiritual ,
A  chave ,
Alvíssaras ,
coisas  que tanto abrem como fecham
uma  vida ,
um livro , 
um  entendimento ,
homem  que  se  ama escondido
e sem aviso te pede em casamento ."

Adélia  Prado ,
in " A duração  do dia " 

Som  na  caixa ...



segunda-feira, 25 de março de 2013

A SERENATA

imagem   da net
 
"  Uma  noite de lua pálida e gerânios
ele viria com boca e mãos incríveis
tocar  flauta  no jardim .
Estou no começo do meu desespero
e só vejo dois caminhos :
ou viro doida ou santa .
Eu que rejeito e exprobo
o que não for natural como sangue e veias
descubro que estou chorando todo o dia ,
os cabelos entristecidos ,
a pele assaltada de indecisão .
Quando ele vier , porque  é certo que vem ,
de que modo vou chegar ao balcão sem juventude ?
A lua , os gerânios e ele serão os mesmos
-só a mulher  entre as coisas envelhece .
De que modo vou abrir a janela senão for doida ?
Como  a fecharei , se não for santa ?
 
Adélia  Prado 
 
Som  na  caixa ...
 
 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

DIREITOS HUMANOS

David  Alexander Colville
 
"  Sei que Deus  mora em mim
 como sua melhor casa .
Sou  sua paisagem ,
sua retorta  alquímica
e para sua alegria
seus dois olhos .
Mas  esta  letra  é  minha ."
 
Adélia Prado ,
in " Oráculos de Maio"

terça-feira, 6 de novembro de 2012

GUIA

Italia Ruotolo 
 
" A  poesia  me  salvará .
Falo constrangida , porque só Jesus
Cristo é o Salvador , conforme escreveu
um homem - sem coação alguma -
atrás de um crucifixo  que trouxe de lembrança
de Congonhas do Campo .
No entanto , repito , a poesia me salvará .
Por  ela  entendo  a  paixão
que Ele teve  por  nós , morrendo  na  cruz .
Ela  me  salvará , porque o roxo
das flores debruçado  na cerca 
perdoa a moça do seu feio corpo .
Nela , a Virgem Maria  e os santos consentem
no  meu  caminho  apócrifo  de entender  a  palavra
pelo seu reverso , captar  a  mensagem
pelo  arauto , conforme sejam suas mãos e olhos .
Ela  me  salvará . Não falo aos quatro ventos ,
porque  temo  os  doutores  , a excomunhão
e o escândalo  dos fracos . A  Deus  não temo .
Que  outra  coisa  ela  é  senão  Sua  Face  atingida 
da  brutalidade  das  coisas ? "
 
 
Adélia  Prado ,
in "  Poesia  Reunida " 

AMOR FEINHO

 
"  Eu  quero  amor  feinho .
Amor  feinho  não  olha  um  pro  outro .
Uma  vez  encontrado , é  igual  fé ,
não  teologa  mais .
Duro  de  forte , o amor feinho é magro , doido  por sexo
e  filhos  tem os quantos  haja
Tudo  o  que  não  fala , faz .
Planta beijo de três  cores  ao redor da casa
e saudade  roxa  e branca ,
da comum e da dobrada . 
Amor  feinho  é  bom  porque não fica velho .
Cuida  do  essencial ; o que brilha nos  olhos  é o que é :
eu sou homem  você é mulher .
Amor  feinho  não tem ilusão , 
o que ele tem é  esperança :
eu quero amor feinho ."
 
 
Adélia  Prado 
 
 

sábado, 6 de outubro de 2012

ENSINAMENTO

 
"  Minha  mãe  achava  estudo
a coisa mais fina do mundo .
Não  é .
A coisa mais fina do mundo é sentimento .
Aquele dia de noite , o pai fazendo serão ,
ela falou  comigo :
" Coitado , até   essa hora no serviço pesado ."
Arrumou  pão  e  café  , deixou tacho no fogo
com água quente .
Não  falou  em  amor .
Essa  palavra  de  luxo ."
 
Adélia  Prado
 
 
Posto , novamente , este poema
que me toca fundo quando
sintetiza  o amor .

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

ENREDO PARA UM TEMA

Marcia  Marostega
 
" Ele  me  amava , mas  não   tinha  dote ,
só  os  cabelos  pretíssimos  e uma beleza
de  princípe  de  estórias  encantadas .
Não  tem  importância , falou  a  meu  pai ,
se  é   só  por  isto ,  espere .
Foi-se  com  uma  bandeira
e ajuntou  ouro  pra  me  comprar  três  vezes .
Na  volta  me  achou   casada  com D. Cristóvão.
Estimo que sejam felizes , disse .
O  melhor  do  amor  é  sua  memória , disse  meu pai .
Demoraste  tanto que ... disse  D.Cristóvão .
Só  eu  não  disse  nada ,
nem  antes , nem depois . "
 
 
Adélia  Prado ,
in  "  Bagagem "
 
 
 

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

CONSANGUÍNEOS

 
" Não  há   culpados  para  a dor que eu sinto.
É  Ele , Deus , quem me dói pedindo amor
como se fora eu Sua mãe e O rejeitasse .
Se  me  ajudar  um  remédio  a respirar  melhor ,
obteremos  clemência , Ele  e  eu .
Jungidos como estamos em formidável parelha ,
enquanto Ele  não  dorme  eu não descanso ."
 
 
Adélia Prado ,
in "  A duração do dia "

sábado, 4 de agosto de 2012

Casamento


 " Há  mulheres  que  dizem :
Meu marido , se quiser  pescar , pesque ,
mas que limpe os peixes .
Eu não . A qualquer hora da noite me levanto ,
ajudo a escamar , abrir , retalhar e salgar .
É  tão  bom , só a gente  sozinhos  na cozinha ,
de vez em quando os cotovelos  se esbarram ,
ele fala coisas  como " este foi difícil "
" prateou no ar dando rabanadas "
e faz o gesto com a mão .
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo .
Por  fim , os peixes  na travessa ,
vamos dormir .
Coisas  prateadas  espocam :
somos noivo e noiva ."

Adélia  Prado

sexta-feira, 8 de junho de 2012

A MEIO PAU


"  Queria  mais  um  amor . Escrevi  cartas ,
remeti  pelo  correio  a copa  de  uma  árvore ,
pardais  comendo no pé  um  mamão  maduro
- coisas  que  não   dou  a  qualquer  pessoa -
e  mais  que  tudo , taquicardias ,
um  jeito  de  pensar  com  a   boca  fechada ,
os olhos tramando  um  gosto .
Em  vão .
Meu  bem  não  leu ,  não  escreveu ,
não  disse  essa  boca  é  minha .
Outro  dia  perguntei  a  meu  coração :
 o  que  há   durão , mal de chagas  te  comeu  ?
Não  ,  ele  disse :  é  desprezo  de  amor ."


Adélia  Prado



                              
                     

segunda-feira, 7 de maio de 2012

BRIGA NO BECO


" Encontrei meu marido às três horas da tarde

com uma loura oxidada.

Tomavam guaraná e riam, os desavergonhados.

Ataquei-os por trás com mãos e palavras

que nunca suspeitei conhecer.

Voaram três dentes e gritei, esmurrei-os e gritei,

gritei meu urro, a torrente de impropérios.

Ajuntou gente, escureceu o sol,

a poeira adensou como cortina.

Ele me pegava nos braços, nas pernas, na cintura,

sem me reter, peixe-piranha, bicho pior, fêmea-ofendida,

uivava.

Gritei, gritei, gritei, até a cratera exaurir-se.

Quando não pude mais fiquei rígida,

as mãos na garganta dele, nós dois petrificados,

eu sem tocar o chão. Quando abri os olhos,

as mulheres abriam alas, me tocando, me pedindo graças.

Desde então faço milagres. "


Adélia  Prado





                   

terça-feira, 3 de abril de 2012

A INVENÇÃO DE UM MODO



"Entre paciência e fama quero as duas,

pra envelhecer vergada de motivos.

Imito o andar das velhas de cadeiras duras

e se me surpreendem, explico cheia de verdade:

tô ensaiando. Ninguém acredita

e eu ganho uma hora de juventude.

Quis fazer uma saia longa pra ficar em casa,

a menina disse:

"Ora, isso é pras mulheres de São Paulo"

Fico entre montanhas,

entre guarda e vã,

entre branco e branco ,

lentes pra proteger de reverberações.

Explicação é para o corpo do morto,

de sua alma eu sei.

Estátua na Igreja e Praça

quero extremada as duas.

Por isso é que eu prevarico e me apanham chorando ,

vendo televisão,

ou tirando sorte com quem vou casar.

Porque que tudo que invento já foi dito

nos dois livros que eu li :

as escrituras de Deus,

as escrituras de João.

Tudo é Bíblias. Tudo é Grande Sertão."


Adélia Prado

segunda-feira, 12 de março de 2012

VEROSSÍMIL



" Antigamente em maio , eu

virava anjo .

A mãe me punha vestido,

as asas ,

me encalcava a coroa na

cabeça e encomendava :

" Canta alto , espevita

as palavras bem ".

Eu levantava voo rua

acima ."



Adélia Prado

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

TRÊS NOMES



" Assim me falou o homem

virtuoso em sua vida :

Deus não é uma luz,

desatenta mulher ,

Deus é pessoa .

Isto pode ser um poema

sob três nomes viáveis :

Aconselhamento espiritual ,

A chave ,

Alvíssaras ,

coisas que tanto abrem como fecham

uma vida ,

um livro ,

um entendimento ,

homem que se ama escondido

e sem aviso te pede em casamento ."



Adélia Prado , in " A duração do dia "

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

ARTEFATO NIPÔNICO



" A borboleta pousada

ou é Deus

ou é nada ."



Adélia Prado , in " A faca no peito "