“ Eu deixei um bilhete sobre a mesa para quando você acordar . Eu tive que sair muito cedo e não sabia que palavras deixar . Eu queria te dizer várias coisas sobre a noite , coisas que começariam com palavras claras e doces mas ligeiramente ácidas , e depois um pequeno segredo e uma declaração firme e discreta e por fim uma frase que seria fria por fora mas quente por dentro como uma sobremesa francesa . Mas foi tão difícil , o sol batia de leve sobre a mesa , você dormia tão próximo e eu ainda não tinha calçado os sapatos , o que certamente interferiu um pouco na minha caligrafia . Seu apartamento de manhã ainda decorado com os restos da noite . Eu não sabia o que dizer , e se a única caneta que encontrei era vermelha você pode supor meu sobressalto e então eu apenas escrevi . É tão tarde , mas eu estou pronta , se você estiver . E desenhei sem cuidado , no canto esquerdo do papel um pequeno veleiro . “ Bilhete
terça-feira, 31 de agosto de 2021
sábado, 31 de julho de 2021
PESSOA , NO ÚLTIMO DIA DO MÊS
JPM /olhares.com
" Todas as cartas de amor são
Ridículas .
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas .
Também escrevi em meu tempo cartas de amor ,
Como as outras ,
Ridículas .
As cartas de amor , se há amor ,
Tem de ser
Ridículas .
Mas , afinal
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são ridículas .
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas .
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas .
( Todas as palavras esdrúxulas ,
Como os sentimentos esdrúxulos ,
São naturalmente
Ridículas .) "
Álvaro de Campos
Som na caixa ...
domingo, 20 de junho de 2021
Mariana Salomão Carrara
Imagem da net
" Também fiquei querendo que livros fossem
igual sanfona . Que tudo que eu escrevesse ficasse
sanfonando na calçada pras pessoas ouvirem em vez
de lerem , já que ninguém sai lendo por aí .
Daí as páginas abriam e fechavam no meu braço
e as palavras iam saindo e se eu escrevesse
muito muito muito bem igual o Leonardo toca,
as pessoas acabariam dançando ."
Mariana Salomão Carrara ,
no livro " Se Deus me chamar não vou "
Som na caixa
terça-feira, 11 de maio de 2021
O BLOG FEZ 11 ANOS
Jean Paul Avisse
Ontem , 10 de maio , este espaço por mim querido
completou 11 anos .
Nestes tempos atuais tão sombrios ainda
se pode sonhar .
E tenho esperança em dias melhores quando
nossos encontros virtuais , através de nossos
blogs , sejam mais alegres .
Como disse Fernando Pessoa :
" Deus quer . O homem sonha . A obra nasce ."
Agradeço a presença de vocês , meus amigos ,
sempre sonhadores .
Beijos em todos .
Marisa
Som na caixa ...
terça-feira, 20 de abril de 2021
LYGIA FAGUNDES TELLES
Jinchul Kim
" Porque não lhe disse antes ?
Apertá-lo demoradamente em meu peito e dizer .
Não disse porque pensava que tinha pela frente
a eternidade .
Só me resta agora esperar que aconteça outra vez,
vislumbro este encontro , mas vou reconhecê-lo ?
E vou me reconhecer nos farrapos da memória
do meu eu ?
Peço que me faça um sinal e responderei ao
código secreto na noite e no silêncio dos navios
que se cruzam e se comunicam no mar ."
In , A Disciplina do Amor
O post de hoje é para parabenizar e homenagear
nossa grande e querida escritora Lygia Fagundes Telles ,
membro da Academia Paulista de Letras desde 1982 ,
da Academia Brasileira de Letras desde 1985 e
da Academia de Ciências de Lisboa desde 1987 , que
no dia de ontem , 19 de abril de 2021 , completou
98 anos .
Salve a escritora !!!!
Som na caixa ...
sábado, 20 de março de 2021
VALTER HUGO MÃE
Tarsila do Amaral
" Todos nascemos filhos de mil pais e de mais mil mães ,
e a solidão é sobretudo a incapacidade de ver qualquer
pessoa como nos pertencendo ,
para que nos pertença de
verdade e se gere um cuidado mútuo .
Como se nossos mil pais e mais as nossas mil mães
coincidissem em parte , como se fôssemos por aí irmãos ,
irmãos uns dos outros .
Somos o resultado de tanta gente , de tanta história ,
tão grandes sonhos que vão passando de pessoa a pessoa ,
que nunca estaremos sós ."
Valter Hugo Mãe ,
in " o Filho de Mil homens "
Som na caixa ...
terça-feira, 16 de fevereiro de 2021
CECÍLIA MEIRELES - A ARTE DE SER FELIZ
Imagem da " net "
José Paulo Cavalcanti Filho , autor do livro
" FERNANDO PESSOA , uma quase autobiografia ",
nos relata :
" Em fins de 1934 , Cecília Meireles vai pela primeira vez
a Portugal para fazer conferências em Lisboa e Coimbra .
Com ela o primeiro marido , e velho amigo de pessoa ,
o pintor português Fernando Correia Dias , que se suicidaria
logo depois , no mesmo mês em que morreria o amigo poeta .
Para ela , Pessoa seria o caso mais extraordinário das
letras portuguesas , e seu mais conhecido poema
" A arte de ser feliz ", tem estilo bem próximo
ao dele .
Cecília telefona a um dos escritórios em que trabalha
Pessoa e marcam encontro , ao meio dia , na Brasileira
do Chiado . Depois de duas horas esperando em vão ,
volta para o hotel em que se hospedou e lá encontra
um exemplar de MENSAGEM dedicado
" A Cecilia Meireles , alto poeta e a Correia Dias ,
velho amigo , e até cúmplice ." Junto , um bilhete
justificando a ausência ; é que sentindo vibrações
mediúnicas , decidira fazer seu horóscopo daquele dia ,
nele vendo que " os dois não eram para se encontrar ."
Cecília nunca veria Pessoa , " mais triste do que
aconteceu , é o que nunca aconteceu ."
A ARTE DE SER FELIZ
" Houve um tempo em que minha janela
se abria para uma cidade que parecia
ser feita de giz .
Perto da janela havia um jardim quase seco .
Era uma época de estiagem , de terra esfarelada ,
e o jardim parecia morto .
Mas todas as manhãs vinha um pobre com
um balde , e , em silêncio , ia atirando com a mão
umas gotas de água sobre as plantas .
Não era uma rega : era uma espécie de aspersão
ritual para que o jardim não morresse .
E eu olhava para as plantas ,
para o homem , para as gotas de água que
caíam de seus dedos magros e meu coração
ficava completamente feliz .
Às vezes abro a janela e encontro
o jasmineiro em flor .
Outras vezes encontro nuvens espessas .
Avisto crianças que vão para a escola .
Pardais que pulam pelo muro .
Gatos que abrem e fecham os olhos ,
sonhando com os pardais .
Borboletas brancas, duas a duas ,
como refletidas no espelho do ar .
Marimbondos que sempre me parecem
personagens de Lope de Vega .
Às vezes , um galo canta .
Às vezes , um avião passa .
Tudo está certo , no seu lugar ,
cumprindo o seu destino .
E eu me sinto completamente feliz .
Mas , quando falo dessas pequenas felicidades
certas , que estão diante de cada janela ,
uns dizem que estas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas ,
e , outros , finalmente , que é preciso aprender
a olhar , para poder vê-las assim ."
Som na caixa ...
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