domingo, 20 de dezembro de 2015

CELEBRAÇÕES

Durr  Wise 

Nos  últimos dias de dezembro comemora-se o nascimento 
do menino Deus e , em seguida ,o início de um novo ano . 
Que , o Natal de todos seja abençoado e que , tenhamos
um 2016  cheio de saúde , paz e esperança .
Republico um poema de Affonso Romano  de Sant'Anna ,
 e , com carinho ,   abraço e beijo vocês . 



" Vai  , ano velho , vai de vez 
vai com tuas  dívidas e dúvidas , vai
dobra  a esquina  da sorte , 
e no trinta e um , à meia noite esgota o copo 
e a culpa  do que nem me lembro
e me cravou entre janeiro e dezembro .

Vai , leva tudo :
destroços , ossos , fotos de presidentes ,
beijos de atrizes , enchentes , secas ,
 suspiros , jornais .
Vade  retrum , para trás , 
leva  para a escuridão  quem me 
assaltou o carro , a casa e o coração .
Não quero te ver mais ,
só daqui a anos , nos anais ,
nas fotos do nunca mais .

Vem  ano novo , vem veloz ,
vem em quadrigas , aladas , antigas 
ou jato de luz  moderna  , vem ,
paira , desce , habita  em nós ,
vem com cavalhadas , folias , 
reisados , fitas multicolores , rebecas ,
vem com uva e mel  e desperta 
em nosso corpo a alegria  ,
escancara  a alma , poesia ,
e, por um instante , estanca 
o verso real , perverso ,
e sacia em nós a fome
de utopia .

Vem na areia  da ampulheta  com
a semente que contivesse outra
semente  que contivesse outra semente 
ou pérola na casca da ostra
como se outra semente  pudesse nascer
do corpo e mente 
ou do umbigo da gente 
como o ovo , o Sol e a gema do Ano Novo 
que rompesse a placenta da noite 
em viva flor luminescente .

Adeus , tristeza :
a vida é uma caixa chinesa 
de onde brota a manhã .
Agora é recomeçar .
A utopia é urgente .
Entre flores de urânio 
é permitido sonhar ."

Affonso Romano  de Sant' Anna ,
no poema ,
 " VAI , ANO VELHO "


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quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

95º ANIVERSÁRIO DE CLARICE LISPECTOR

Cristine  Peloquin

" Quem  já conheceu o estado de graça  reconhecerá 
o que vou dizer . 
Não me refiro à inspiração , que é uma graça especial
que tantas vezes acontece  aos que lidam com arte .
O estado de graça de que falo não é usado para nada .
É como se viesse apenas para que se soubesse que
realmente existe .
Nesse estado , além da tranquila felicidade que se irradia
de pessoas  e coisas , há  uma lucidez  que só chamo de
leve  porque na graça tudo é tão , tão  leve .
É uma lucidez de quem não adivinha mais :
sem esforço , sabe . Apenas isto : sabe .
Não perguntem o que , porque só posso responder 
do mesmo modo infantil : sem esforço , sabe-se .
E há uma bem aventurança  física que a nada se compara .
O corpo se transforma num dom .
E se sente que é um dom  porque se está experimentando,
numa forma direta a dádiva  indubitável
 de existir  materialmente .
No estado de graça  vê-se às vezes  a profunda beleza,
antes inatingível , de outra pessoa .
Tudo , aliás , ganha uma espécie de nimbo que não é
imaginário : vem do esplendor  da irradiação  quase
matemática  das  coisas e das pessoas .
Passa-se  a sentir que tudo  que existe -pessoa ou coisa -
respira e exala  uma espécie de finíssimo resplendor 
de energia .     A verdade do mundo é impalpável .

( ...)

Depois , lentamente  se  sai .

( ...)

Sai-se   do estado de graça  com o rosto liso ,
 os olhos abertos   e pensativos   e , embora 
não se tenha sorrido , é como se o corpo  todo
viesse  de um sorriso  suave .
E sai-se melhor criatura do que se entrou .
Experimentou-se alguma coisa  que parece redimir
a condição humana , embora ao mesmo tempo  fiquem
acentuados  os estreitos limites desta condição .
E exatamente  porque depois da graça  a condição humana
se revela na sua pobreza implorante ,
 aprende-se  a amar mais, a esperar  mais .
Passa-se  a ter uma espécie de confiança  no sofrimento
e em seus caminhos  tantas vezes intoleráveis .
Há dias que são tão áridos e desérticos  que eu daria
anos de minha vida  em troca de uns minutos de graça ."

Clarice Lispector ,
na crônica " Estado de graça ".

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.

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

PABLO NERUDA

Lauri Blanc 


"  Talvez não ser é ser quem tu sejas ,
sem que vás cortando  o meio dia 
como uma flor azul , sem que caminhes 
mais tarde pela névoa e os ladrilhos 
sem essa luz que levas na mão 
que talvez outros não verão dourada ,
que talvez ninguém soube que crescia 
como a origem rubra  da rosa ,
sem que sejas  , enfim , sem que viesses 
brusca , incitante , conhecer minha vida ,
aragem de roseira , trigo do vento ,
e  desde então  sou porque tu és ,
e desde então és , sou e somos 
e por amor serei , serás , seremos ."

in , Cem sonetos de Amor ,
LXIX

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sexta-feira, 20 de novembro de 2015

QUEM ENTRARÁ NO PARAÍSO ?

Jean -Paul Nacivet

 " Alguns não sabem brincar . Ao invés de brincar ,
abrem  seu baú  de ferramentas de trabalho .
Mas  a Criança  não se interessa pela mala .
Os chegantes se sentem ofendidos .
 Dizem que foram à  escola para deixar de ser 
crianças e se tornar adultos . 
Suas ferramentas são sua prova.
A Criança lhes sorri e lhes diz que , naquela escola,
eles não passaram . Não podem entrar no Paraíso .
Ficaram de D.P.
" Voltem quando tiverem deixado  de ser adultos .
Voltem quando tiverem voltado a ser crianças ."

Rubem Alves ,
in "  Do Universo à Jabuticaba "

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sábado, 7 de novembro de 2015

MÚSICA DE HOJE : CAETANO VELOSO

Jean-Paul Nacivet

" Não vejo mais você faz tanto tempo 
Que vontade que eu sinto
De olhar  em seus olhos  ganhar seus
abraços ,
É verdade , eu não minto 

E nesse desespero em que me vejo 
Já cheguei a tal ponto 
De me trocar diversas vezes por você  
Só pra ver  se te encontro 

Você bem que podia perdoar 
E só mais uma vez me aceitar 
Prometo agora vou fazer por onde 
nunca mais perdê-la 

Agora , que faço eu da vida sem você ?
Você não me ensinou a te esquecer 
Você só me ensinou a te querer
E te querendo  eu vou tentando  te
encontrar 
Vou me perdendo 
Buscando em outros braços seus
 abraços 
Perdido no vazio de outros passos 
Do abismo em que você se retirou 
E me atirou  e me deixou aqui sozinho

Agora , que faço eu da vida sem você ?
Você não me ensinou a te esquecer  
Você  só me ensinou a te querer
E te querendo vou tentando me 
encontrar 

E nesse desespero em que me vejo
Já cheguei a tal ponto 
De me trocar diversas vezes por você 
Só pra ver se te encontro 

Você bem que podia perdoar  
E só mais uma vez me aceitar
Prometo agora vou fazer por onde 
nunca mais perdê-la 

Agora , que faço eu da vida sem você ?
Você  não me ensinou a te esquecer 
Você  só me ensinou a te querer
E te querendo  eu vou tentando te
encontrar 
Vou me perdendo 
Buscando em outros braços  seus
abraços 
Perdido no vazio de outros passos 
Do abismo em que  você se retirou 
E me atirou  e me deixou aqui sozinho

Agora , que faço eu da vida sem você ?
Você  não me ensinou a te esquecer 
Você só me ensinou  a te querer
E te querendo  eu vou tentando  me
encontrar ." 

 in , Você não me  ensinou a te esquecer 

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sábado, 31 de outubro de 2015

113 º ANIVERSÁRIO DE DRUMMOND

Pascal  Roy

" Desejo  a  você 
Fruto do mato
Cheiro de jardim 
Namoro no portão
Domingo sem chuva 
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme de Carlitos 
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos 
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver  a Banda passar
Noite de Lua Cheia 
Rever uma velha amizade 
Ter fé em Deus
Não ter que ouvir a palavra não
Nem nunca , nem jamais e adeus .
Rir como criança 
Ouvir canto de passarinho
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal 
Tomar banho de cachoeira 
Pegar um bronzeado legal
Aprender uma nova canção
Queijo com goiabada
Pôr do Sol na roça 
Uma festa
Um violão 
Uma seresta 
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria 
Uma tarde amena 
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona 
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu ."

Carlos Drummond de Andrade,
no poema " Desejos "

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sexta-feira, 23 de outubro de 2015

DEZ CHAMAMENTOS AO AMIGO

Anna  & Elena  Balbusso 

II

"  Ama-me  . É tempo ainda . Interroga-me .
E  eu  te  direi  que o nosso tempo é agora .
Esplêndida altivez , vasta  ventura 
Porque é mais vasto o sonho que elabora 
Há tanto tempo sua própria tessitura .
Ama-me  embora eu te pareça 
Demasiado  intensa . E de aspereza .
E transitória  se tu me repensas ."

Hilda  Hilst 
in , " Júbilo , memória , noviciado da paixão "

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